"Pior do que uma mulher que fala o que pensa, é uma que escreve..." (Tati Bernardi)

sábado, 24 de setembro de 2011



Percorreu seu corpo nu da cabeça aos pés, como se estudasse as sardas e os poros, e disse: 
- a única coisa que eu mudaria em você é o endereço.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

O homem mais bonito do mundo.



Uma vez eu conheci o homem mais bonito do mundo. Eu estava sentada no chão de uma festa com pocinhas. Toda festa de jornalista forma pocinhas, pode reparar. E ele veio falar comigo “vai molhar a calça”. Ah, mas vou mesmo. Se tratava do homem mais bonito do mundo, eu não tinha nenhuma dúvida. Quem poderia ser mais bonito do que ele? Javier Bardem? Não. Basta vê-lo no filme da cólera pra saber o potencial que ele tem pra feiúra. O Brad Pitt? Eu prefiro os morenos. O Jesus Luz? Acho fraco, ele tem aquele lapso de vergonha suburbana no branco dos olhos. Não gosto de homem que se sente devendo algo ao cosmos. Homem que faz pose de topo de cadeia alimentar mas sofre as dores de uma coluna ainda arredondada pelo começo da evolução. Enfim, tratava-se do homem mais bonito do mundo. E ele veio falar comigo. E eu estava sentada no chão. E ali mesmo trocamos uns beijos e telefones e confissões e eu lembro que, apesar de estar com muito sono e cansaço e desesperança com a vida, fiquei tentando descobrir o que um homem daquele nível supremo de beleza (um metro e noventa, olhos azuis, cabelos castanhos cacheados, ombros que iam até o Chile) tinha visto numa garota bem mediana que estava sentada no chão em um dos dias de menor brilho de sua carreira social. Apliquei o teste do cotovelo durante o beijo (a leve roçadinha sem querer pra saber se o membro promete ou não promete). Apliquei o teste da sapiência média (você comenta que quando você olha pro abismo, o abismo olha pra você, e espera pra ver se ele tem alguma cultura de filosofia de almanaque). Apliquei o teste da bobeira erudita, uma merda qualquer que você lança no ar tipo “ai que vontade de chafurdar por essas lamas universais” e se o cara for minimamente interessante ele compra a besteira e devolve uma outra melhor ainda. Se ele for um tapado ele ri e fala algo idiota tipo “quero o mesmo que você está tomando” e daí você sabe que está, novamente, sozinho no mundo. Como sempre. E ele, do alto de sua absurda e dolorosa beleza, foi tirando nota sete e meio em todos os quesitos. Devolveu uma besteira à altura, conhecia frases pessimistas perfeitas para uma noite estrelada e passou com certo louvor no teste do cotovelo. No dia seguinte, já pela manhã, chegou uma mensagem de texto do homem mais bonito do mundo “quero te ver”. E foi então que resolvi pedir ajuda. Juntei a mulherada em casa. E todas nós, em silêncio, começamos a “googla-lo”. Até que uma foto bem grande, dele só de bermuda, sorrindo, ocupou a tela inteira e o coração de todas nós. Algumas suspiraram. Algumas tiveram ataque de riso nervoso. Uma ficou bem irritada e foi embora. Outras me olharam com a miopia bem apertada tentando descobrir que é que eu tinha pra merecer aquilo tudo. Ele era realmente o homem mais bonito do mundo. Todas concordaram. Não existe homem mais bonito do que esse e talvez nunca existirá. E, ao que tudo indica, trabalhador, com amigos do bem, amante da natureza e das crianças. A ficha.com estava limpíssima. Mas você viu se ele…Vi, vi, sim, ele passou no teste do cotovelo. Burro? Não. Então o quê hein? Pois é, amigas tão honestas, eu também não sei o que ele viu em mim. Tentaram uma última explicação, olhando para os meus pés “ah, vai ver ele gosta de sexo bizarro”. É, vai ver. Outra explicou assim “ah, tem tanto casal que a gente vê e não se conforma”. Pois é. Fiquei quarenta e sete dias com o homem mais bonito do mundo. Todo mundo olhava pra ele. Homens, mulheres, velhinhos, crianças, cachorros, pombas, formigas. Ele poderia ter qualquer uma das anjinhas da Victoria’s Secret (caso além de perfeito fosse trilhardário também...não era o caso, mas era bem de vida) mas preferia estar comigo. Ele definitivamente não tinha nenhum problema sexual, aliás, muito pelo contrário: fazia parte do seletíssimo grupo de homens que, apesar de não fazer feio em medidas, são adeptos do sexo minimalista (aquele que sabe o valor da delicadeza pontual, ritmada, paciente e amorosa), entendia os filmes do Reserva Cultural e me explicava as palavras mais difíceis das músicas do Radiohead. Tudo ia muito bem até que um dia, na fila pra comprar uma bomba de chocolate numa rua de Higienópolis, eu resolvi explodir aquela relação. Ele era tão bonito que me...que me...que...sei lá. Lembro que na hora pensei algo assim “ah, má vá ser bonito assim lá na puta queo pariu”. E ele foi.

Que eu possa morrer de amor e, ainda sim, ser discreta.




... Que eu possa sentir tristeza sem que ela se aposse de toda a minha alegria. E que, se um dia eu for abandonada pelo amor, não deixe que esse abandono seja para sempre uma companhia.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Ela te deu espaço. Um lugar ao lado, duas prateleiras do armário e todos os compartimentos de seu coração.





Te deu apoio quando foi preciso, te deu a mão pra caminhar junto e abraçou o mundo de planos bonitos que você apresentou. Ela ignorou os rumores passados, apontou e remou pro futuro, preferiu pagar pra ver as delícias do presente a dois. Mas agora você esta aí, se distraindo com o horizonte, talvez dramatizando que a vida é mesmo difícil.
Ela, que não é fácil, admite que contém malaguetas em seu temperamento, reconhece os que se arriscam a lidar com seus ensaios tempestivos e nessa, meu amigo, você foi condecorado. Ela sabe, e você também, que ainda assim, como "A Ana" ela é doce quando doce e sabe do que você gosta. Café forte, música baixa, terças pro futebol, torta de amendoim, beijo no pescoço. Ela sabe te ganhar. Assim como também se vê conquistada, desarmada. Colo pra dormir, suco fresco de limão, barzinho aos fins de semana, massagem nos pés. Dos paparicos recíprocos. Com tanto infinito particular na balança, ela, sem hesitar, reinventou seus rumos. Apagou suas burradas, perdoou seus passos errantes, considerou seus diferenciais, venceu o medo do amanhã e apostou num sentimento nunca antes vivido. Ela, que não se arrepende nem um minuto, vive de aprender com você. Aprender como ignorar uma provocação, como pensar vinte vezes antes de proferir palavras tortas, como fazer noites de chuva virarem madrugada. Ela compreende teus defeitos, admira sua mansidão, aprendeu tuas receitas, entrou pra tua história e te nomeou personagem principal da dela. E como é lindo os capítulos que vocês escrevem juntos. Pintando de sonho a vida real, driblando os dias nublados, legitimando a fortaleza de um sentimento verdadeiro. Se não me engano, é este mesmo sentimento que vence os atritos triviais, a maldade alheia, o possível cansaço de dias iguais. Não lhe importa a opinião avessa, ela aposta no seu sucesso, topou a futura viagem para a Indonésia, te convenceu de conhecer Paris. Soube que ela até mudou de idéia sobre a idéia de casamento, só não abre mão de não alterar o sobrenome.
Sim, sei que em muitas coisas você cedeu também. Mas há tanta vantagem pra você relevar. No entanto, dominado pelo orgulho, você continua aí, perdendo noites de sono, confundindo pirraça com solidão. Pensa comigo, meu caro. Não há motivo pra essa birra agora. Se ela tem um lado que arde e expressa ciúme, é porque cara feia não lhe convém. Se reclama do seu cigarro, é porque te quer bem. Se te cobra mais tempo junto, é porque o muito é pouco quando se está junto de quem faz o tempo e o pensamento voar. Se não te procura após uma briga, não é castigo, meu amigo, ela flerta com a saudade. Quer ver se te inquieta também.
Nos dias deste silêncio bobo, fez uma carta contando tudo que adora no teu jeito, revelou aquela foto na praia, comprou seu bombom preferido, ensaiou o beijo mais bonito.
Você me pergunta se no meio desse orgulho desnecessário ela ainda pensa em você? Cara, desconfio que ela te ama.

( Yohana SanFer / Título Original do texto: She loves you )

terça-feira, 6 de setembro de 2011